sexta-feira, 22 de julho de 2011

Mente limpa, mente aberta.

(reflexão baseada no filme Sem Limites, por Carla Laforgia)

“Por que ao realizarmos os maiores sonhos de nossas vidas, alguém nos apunhala pelas costas? Bom, posso dizer-lhes uma coisa: jamais deixarei que eles me toquem” [...]
Eddie – (personagem do ator Bradley Cooper no filme Sem Limites)

Qual a motivação que precisamos para realização de algum desejo? E como conseguimos por vezes aniquilar alguns desejos? Sonhos empurrados para longe, por consequência da contra vontade do inconsciente ou apenas deixamos cair no esquecimento pela conformidade da premissa de que não daria certo?

Por que deixamos passar? O que não conseguimos enxergar no momento exato de determinada vontade de realizar algo que não realizamos?

Neste filme no qual me inspiro para reflexão analítica acerca da mente humana, o personagem, sendo ele mesmo em sua pura essência, largado e desencanado do conforto básico que a grande maioria das pessoas procura manter em suas vidas, parece sofrer por não conseguir realizar seu sonho de escrever um livro, não pelo simples motivo de escrever, mas por não conseguir acessar a sua mente.

É notória a sua necessidade de reconhecimento, contudo, não consegue seguir em frente, passa a ser descrente daquilo que deseja aos olhos alheios, perde a admiração da namorada, os amigos não o levam a sério. Mas suas ideias estão lá, vivas, apenas é preciso uma oportunidade para dar o primeiro passo, acessar a mente... acessar a mente.
"A memória age como a lente convergente na câmara escura: reduz todas as dimensões e produz, dessa forma, uma imagem bem mais bela do que o original.” Arthur Schopenhauer
A mente humana é um verdadeiro labirinto o qual, a ciência ainda não conseguiu pleno acesso.

É possível por meio de cirurgia retirar parte do cérebro que comanda as emoções, é possível deixar de amar, é possível retirarmos as lembranças do passado.

É possível controlar o humor e nossos devaneios por meio de remédios psicotrópicos.

Mas não há possibilidade de implantar motivação, idéias, sonhos, vontades... desejos. Tais sentimentos abstratos vêm de dentro e nunca de fora, o externo não tem relação alguma com nossas dificuldades em agir, em sonhar, em realizar vontades.

No filme, em dado momento, Eddie, o personagem principal, recebe uma pílula, a pílula da genialidade que faz com que ele tenha pleno acesso a tudo o que está em seu subconsciente, e adquire facilidade de memorização e raciocínio rápido. Ganha reconhecimento por seus atos e isso lhe dá maior impulso motivando-se a realização de tornar vivo o seu livro. 
 "As únicas coisas que valem a pena serem ditas são as que esquecemos, tal como as únicas coisas que valem a pena serem feitas são as que surpreendem o mundo." Oscar Wilde.
Penso em quantas oportunidades deixamos de perceber por construirmos premissas falsas. O ser humano tem plena capacidade consciente, o que nos difere dos animais irracionais. Por um outro lado, nossas próprias ideias nos afastam de nossos sonhos. Construimos informações falsas e negamos sem perceber, o acesso ao subconsciente.

Nos pautamos pela obviedade. “aquilo que parece ser, é o que de fato parece ser, não há duvida e nem questionamento”.

Eddie, quando toma sua primeira pílula, percebe algo novo da sua “senhoria” (proprietária do apartamento o qual ele morava e estava em dívida com o aluguel), ele a escuta pela primeira vez. Sua mente clareia e ele consegue perceber outra realidade.  E quebra a discussão lhe perguntando: “Mas minha existência não devia incomodá-la tanto. O que é?”
E assim modifica todo aquele quadro.

Sabemos que tudo se modifica, tudo muda, mas não necessariamente para melhor. Geralmente o que nos apresenta como um novo quadro melhor, se auto modifica tão rápido que nos parece apenas ilusão de ótica. E assim é.  Tudo muda, mas quem melhora o que mudou somos nós. 

Todo ser humano tem a capacidade de melhorar um determinado “quadro”, mas isso só é possível se houver permissão de si mesmo para consigo mesmo.

O bloqueio ocasionado pelo pré determinismo, a pré conceituação, o vicio de não escutar, nos impede de ter acesso aos detalhes. Somos condicionados a ouvir, mas nunca escutar o outro. Percebemos tudo, exceto as coisas pequenas e sem essa percepção, não temos a visão do “todo”. Mas apenas do que queremos. E o que queremos passa a ser pequeno, pois nos bloqueamos na realização das nossas vontades. 

Escutar alguém determina compreender, de forma imparcial e sem julgamento algum. Geralmente já pré determinamos o que o outro é e quer,  ouvimos o outro mas escutamos a nossa voz interior. Dessa forma, impedimos de compreender novas razões, pois somos viciados as nossas opiniões em razão de sermos naturalmente aliados de nós mesmos.
“É a minha opinião, e sou a seu favor.” Henri Monnier
“Mesmo se me convenceres, não me convencerás.” Aristófanes
“Os homens são movidos e perturbados não pelas coisas, mas pelas opiniões que eles têm delas.” Epitecto
Penso que a imparcialidade ao escutar o outro está caraterizada nos detalhes: ações voluntárias, sutilezas e simplicidade. Situações que não percebemos de maneira consciente, mas que estão guardadas na memória.

O ser humano é dotado de ideias que sem motivação não consegue capacidade de executá-las.

Viver é uma obrigação, a diferença está em como escolhemos seguir nossos dias. A motivação torna-se tudo mais suportável, transforma momentos da vida em intenso prazer. 

A liberação de serotonina, química essencial em nosso cérebro, aniquila qualquer fator externo que venha contrariar a realização de alguma vontade.

Em um momento Eddie diz: “Estava cego, agora enxergo”.

Quantas vezes já não percebemos posteriormente algo que antes não havíamos sentido? Pode-se afirmar que a esse lapso de memoria se deu por experiência posterior? Ou poderia ser o nosso bloqueio natural de não querermos ver para simplesmente não termos de enfrentar?


O conformismo seria a interrupção do efeito da motivação para realização de algo.
“As boas resoluções estão sujeitas a uma fatalidade – são sempre tomadas demasiado tarde.” Oscar Wilde
Não que devemos nos obrigar a realizar nossas ideias, não que devemos nos sentir motivados cem por cento de cada fragmento de segundo de nossas vidas, mas que se possível fosse, adquirir a pílula da genialidade, diria que o ideal é ter acesso a própria mente, de forma limpa e aberta, a visão de um todo e não de tudo.

Por mais que o ser humano compreenda o fluir da vida, como ensina Heráclito e o devir como ensina Pitágoras, não há que se negar que as experiências da trajetória da vida, traçam caminhos cheios de convicções, e essas convicções nos fecham para realização de vontades.

Não há confirmação de outras vidas pós morte, nem seria essa uma certeza ideal.

Ideal seria se o ser humano compreendesse que a melhora de um quadro de sua vida depende das cores que ele deseja usar e sua motivação para tal está em ser imparcial com a própria vida, deixando de lado as convicções criadas. Não trata-se de ambição, trata-se de sabedoria.

Aproveitar a vida como ela é: única.

Sonhar, desejar, ter ideias? Mas agir, fazer acontecer, seguir em frente, enfrentar a si mesmo, apagar conceitos gerados, perceber detalhes, tirar a roupagem do óbvio e mergulhar no que há dentro dele. Assim abre-se a mente, mente limpa, pronta para o que há de novo, pronta para escutar o que foi jogado no subconsciente. 

Consciência plena no plano da ação na atmosfera do livre pensar, a sabedoria da genialidade da vida é estar pra si em  plenitude do viver imparcialmente no que se refere a observar o mundo.

Não posso deixar de colocar que Eddie deixou-se enganar atribuindo a si como felicidade, o poder em detrimento dos outros. Modificou-se por completo, sua aparência antes simplória e ao meu ver mais natural, tornou-se impecável e anti natural. Como? Eis que estou aqui a julgar o personagem em minha análise de sua aparência e atitudes antes da pílula da genialidade? Sim, mas posso compreender os detalhes e perceber portanto que a motivação de Eddie foi chegar ao topo da vida, ou seja, atribuir sua verdadeira essência na sua existência, ser quem ele deseja ser e estar com quem ele deseja estar.
E você? É capaz de abrir sua mente para si mesmo?

Seria preciso mergulhar nos seus segredos mais profundos e jogar fora o que não lhe é válido e partir rumo aos desejos que um dia você desistiu.

A pílula da genialidade que nos permitiria enxergar o todo é o aniquilar o medo do fracasso, aprender a escutar sem convicções velhas e ultrapassadas, não ter receio, viver a vida, simplesmente viver a vida...
Para que no final da vida não pensemos:
“Porque a vida passou antes que pudéssemos viver.” Vitor Hugo

Carla Laforgia paz

 

Documentário BBC:

3 comentários:

  1. Muito bom, Carla.
    A vida pode ser entendida como o Bem maior; uma visão trágica de mundo engrandece sem endurecer.
    Parabéns, beijo.

    ResponderExcluir
  2. Olá Carlinha!

    Quero te parabenizar pelo excelente texto de análise do filme "Sem Limites". O filme é bem interessante e nos faz pensar muito sobre a importância das condições mentais na relação do homem com o mundo.

    Estes tempos comecei a jogar e a estudar xadrez, é um jogo que exige muito raciocínio e bastante capacidade de concentração. Jogava contra o computador e constatei algo que me deixou pensativo: Meu sucesso em conseguir vitórias estava diretamente proprorcional ao meu estado físico e mental. Toda vez que minha mente estava cansada após um longo dia de trabalho, eu perdia, cometia erros banais. Mas, quando eu jogava após um período de repouso de sono eu geralmente conseguia vitórias. Conclui que existem momentos em que estamos mais aptos intelectualmente falando. E que o estado do cérebro é uma condição essencial para nosso sucesso ou fracasso intelectual.

    Sobre o texto que você escreveu. Pois é, muitas vezes não conseguimos discernir nossa realidade na relação com o mundo. Por ignorarmos o que somos ou então por ignorarmos a realidade que nos cerca. Uma vez que sabemos que em determinadas condições estamos aptos para realizar com sucesso determinadas tarefas, devemos então planejar para que tais condições estejam presentes, ou o contrário, planejar para evitar agir em condições próprias ao fracasso. No caso do filme, o protagonista tinha a seu favor a "pílula mágica" (lembrei da pílula vermelha do filme Matrix) que o fazia explorar todas a potencialidades de seu cérebro. Não temos esta pílula, mas podemos sim, nos colocar em condições de melhor explorar nossas possibilidades. E existem muitos meios para isto, como você mesmo apontou.

    O maior desafio é sair de um estado de fracasso para um de sucesso. Pois temos uma dificuldade imensa de olharmos objetivamente a realidade, embora uma objetividade absoluta seja impossível. O método filosófico que adoto, método fenomenológico, ajuda de alguma forma a entender este problema. Este método procura olhar a realidade como ela realmente é, sem ir além do que ela diz no momento. Se o momento é de fracasso, de limitação, de impotência, isto não nos autoriza a dizer que em essência somos fracassados, limitados e impotentes. A existência abre possibilidades para em que determinadas condições eu possa mudar meu estado.

    No mais, não consegui ver o vídeo ainda. Aqui em casa a rede está muito sobrecarregada. Tem muita gente acessando a internet e a conexão fica lenta. Logo que tiver condições, faço isto. :)

    Muito bom o texto, muito bom o filme e muito bom compartilhar idéias contigo.

    Beijos!

    ResponderExcluir
  3. A pergunta, a partir da exigência, direi até mecanicista, de estar no mundo, que está pílula interferiria na ordem mundial, seria um novo "fruto proibido", mas seria ético? Considerando a questão da saúde onde não sofreria interferência, ou seja totalmente controlado.

    ResponderExcluir